Já foi o tempo em que lugar de
lixo era só a lixeira. Com as questões ambientais cada vez mais em alta, a
palavra de ordem é reaproveitamento. Do óleo de cozinha às sobras de tecido,
tudo pode ganhar uma segunda utilidade — basta um pouco de boa vontade e imaginação.
Na Zona Sul, muitas pessoas, lojas e empresas já aderiram a essa prática. É o
caso do artista plástico Evandro Jr, que cria quadros e outros objetos de
decoração a partir de materiais reciclados.
— Quando comprei uma casa em
Itaipava, estava um pouco desiludido. Achei que o mundo estava muito destruído
e comecei a experimentar, na arte, um lixo lindo que vinha até da mata. Deu
certo — conta Evandro, que acaba de inaugurar uma loja no Shopping da Gávea.
O trabalho de Evandro Jr foi
batizado de “Assemble”, que, segundo ele, significa “a construção do equilíbrio
pela disposição das peças”. Em seu processo de criação, ele usa vários tipos de
materiais reaproveitáveis que consegue em bares, restaurantes, armazéns e
brechós.
— Uso aquilo que, a meu ver, tem
leitura de arte. Tudo que pode ser customizado, mas com uma suave elegância.
Esse é o truque. Recentemente, fui a um cemitério e vi uma peça incrível, mas
logo me lembrei do Ronaldo Esper (que foi detido em 2007 por tentar roubar dois
vasos de um túmulo em São Paulo) e saí correndo da tentação — brinca o artista.
Seguindo o mesmo conceito, de
fazer peças a partir de materiais que iriam para o lixo, o artista plástico
Sergio Cezar, de Laranjeiras, ficou conhecido por seus projetos de arquitetura
em papelão. Foi ele quem criou a favela que aparecia na abertura da novela
“Duas caras”, exibida entre 2007 e 2008 pela Rede Globo. O artista foi tema do
curta-metragem “O gigante do papelão”, lançado no ano passado e já exibido em
12 países. Atualmente, Cezar está trabalhando com peças de moda, inspiradas no
conceito art fun, todas criadas com papelão.
— Aprendi a dar valor à
reciclagem com o meu pai. Quando eu era criança, queria de qualquer maneira uma
bicicleta, mas ele não tinha condições de comprar uma. Então, por oito meses
ele juntou sucata e foi montando uma, sem eu saber. Em um aniversário
inesquecível, pude, enfim, ganhar meu tão sonhado brinquedo — lembra,
emocionado.
No sábado, a partir das 14h,
Cezar vai abrir seu ateliê, na Rua Cardoso Júnior 134, para uma exposição. Ele
dá aulas de arte com materiais recicláveis, serviço que também é oferecido pelo
Galpão de Artes da Comlurb (3874-5148), na Gávea.
E se arte sustentável está na
moda, grifes da Zona Sul já estão acatando a tendência. A Sementeira, no
Shopping da Gávea, criada pela designer Camila Bezerra, trabalha com malhas
feitas de garrafas PET recicladas e seus móveis são de madeira de demolição.
A grife Balaco, da designer Julia
Vidal, dedicada à identidade cultural brasileira, tem proposta semelhante. No
ateliê da marca, em Laranjeiras, sobras de tecidos de coleções anteriores são
reutilizadas.
— Não geramos lixo para o meio
ambiente e reaproveitamos resíduos para produtos como guirlandas e acessórios —
diz Julia.
Restaurantes e bares da região
também estão mudando de atitude em relação ao lixo. O Belmonte, no Leblon, é um
dos quase 200 estabelecimentos gastronômicos da Zona Sul que doam óleo de
cozinha usado para a cooperativa Disque-Óleo, que usa a gordura na produção de
sabão, detergente, ração animal e biodiesel.
— Infelizmente, ainda não
reciclamos nem 10% do óleo que é usado em restaurantes da região. Com o
surgimento do biodiesel, está melhorando um pouco. Acredito que até 2016
consigamos dobrar a produção — diz Marcelo Oliveira, executivo da cooperativa.
Para incentivar a doação,
Oliveira costuma fazer negociações com os donos dos estabelecimentos. A cada 30
litros de óleo doados, a cooperativa retribui com produtos de limpeza.
A sanduicheria Focaccia também
tem práticas de sustentabilidade. Na loja do Shopping Leblon, existe uma
parceria com a comunidade da Cruzada São Sebastião, para onde o material segue
e é reciclado. E, no restaurante do Baixo Leblon, todo alumínio descartado é
recolhido diariamente por um grupo de catadores.
A Deliziosa Pasta Spressa, em
Ipanema, além de madeira de demolição, usa potes, talheres, canudos e sacolas
plásticas biodegradáveis. Além disso, Marcelo Andrade, sócio da loja, acaba de
fechar uma parceria com uma empresa de consultoria gastronômica para um
treinamento dos funcionários — o objetivo é promover a economia de água e luz e
ensinar a descartar materiais.
— Queremos criar a cultura da
sustentabilidade na nossa equipe — diz Andrade.
No Bar do Horto, a decoração, com
luminárias de garrafas PET e tampinhas plásticas faz toda a diferença.
— Além de chamar a atenção de
quem passa, estamos contribuindo para o meio ambiente — afirma Samantha
Rodrigues, dona do estabelecimento.
Iniciativas coletivas também
existem na região e ajudam na preservação do meio ambiente. No condomínio Maxi
Leblon, no Alto Leblon, todos os moradores, segundo o síndico Oscar Moreira,
separam o lixo para a coleta seletiva.
— No início, houve certa
relutância, mas, hoje, posso dizer que atingimos a marca de 100% de condôminos
participantes. Antes, havia muitos ratos e baratas na lixeira, e o cheiro de
sujeira era forte. Agora, acabou — afirma o síndico.
O Maxi Leblon faz parte de um
grupo de centenas de condomínios da Zona Sul que fazem coleta seletiva. Apesar
disso, a Comlurb informa que o lixo disponibilizado para a reciclagem
corresponde a apenas 1% do total produzido.
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